Fotografia: tributo à impermanência

A psicologia diz que o ser humano, ao se comportar voluntariamente, o faz basicamente por dois motivos: obter consequências agradáveis ou evitar/fugir de situações desagradáveis. Cada ação humana, no entanto, é muito complexa e geralmente tem múltiplos fatores envolvidos. Mas as premissas básicas são essas. Não seria demais dizer que, em geral, passamos os nossos dias buscando prazer e fugindo da dor. Quando não conseguimos evitar as situações que nos incomodam, nos sentimos tristes e irritados.

Mas qual é a nossa tendência ao nos encontrarmos numa situação prazerosa, como estar com alguém querido, assistir a um bom filme ou contemplar uma paisagem visualmente estimulante? O movimento é de tentar perpetuar o momento, buscar garantias de que ele continuará ou se repetirá. É muito difícil simplesmente nos satisfazermos com a situação em si: preocupamo-nos com o futuro e com formas de fazer que ela, de alguma forma, dure para sempre. Na nossa cultura, somos lembrados disso o tempo todo. Consumimos desenfreadamente a fim de buscar a satisfação que, quando ocorre, dura muito pouco; na tentativa de perpetuá-la ou mantê-la, voltamos a consumir, num ciclo sem fim.


Justin De La Ornellas

Dentre os diversos aspectos da fotografia – ou, nesse caso, do fotografar – está justamente essa tentativa de manter as coisas como elas são num determinado momento especial. Quando viajamos, nos deparamos com diversos cenários que nos causam boas sensações, seja pelo espetáculo visual, cultural ou histórico. E tentamos levar um pouco disso conosco, através das fotografias. Quando estamos numa festa ou numa reunião de amigos, fotografamos, em parte, em função do desejo de manter um pouco da alegria que é se estar com as pessoas de quem gostamos.

Entretanto, nada dura para sempre. A forma de ser do mundo é a mudança, a finitude das situações, das relações e até mesmo da natureza em si. Ao nos darmos conta disso, chega a ser irônico que utilizemos um dispositivo que captura uma fatia ínfima do tempo – a câmera fotográfica – na tentativa de perpetuá-la. A fotografia, então, é tão antagônica à natureza de constante mudança das coisas que acaba reforçando a ideia de impermanência. Ao olharmos uma foto, ainda na câmera, no instante seguinte em que ela foi tirada, já podemos ver que aquilo já não existe mais. Cada fotografia torna-se, então, imediatamente, um tributo à impermanência daquilo que ela retrata. Não é à toa que alguns autores associam a fotografia com a morte: de certa forma, ela é um atestado de óbito, ainda que apenas de um determinado momento.