Temos grandes expectativas em relação à vida. Esperamos e lutamos para ter momentos de grande felicidade, êxtase, euforia. Abominamos o tédio, a monotonia, o ordinário. Queremos o especial sempre. Durante a semana, queremos que o fim de semana chegue. Durante o ano, queremos que cheguem as férias. Quando estamos em casa, desejamos o momento em que poderemos viajar. Se estamos sozinhos, torcemos pela hora em que estaremos com outros. No trânsito, ansiamos pelo momento em que chegaremos. Ficamos ansiosos à espera da nossa vez.
Certos autores na psicologia defendem que vivemos em constante falta. Há sempre uma coisa que poderia ser melhor, uma situação que poderia ser diferente, um incômodo que poderia não existir. A falta gera desejo, movimento, nos impele à ação, na tentativa de suprir essa carência. E aí vamos atrás de dinheiro, de pessoas, de lugares, de experiências. Às vezes, chegamos bem perto dessa satisfação. Conseguimos o que queremos e, por alguns instantes, temos paz. Mas ser humano não é fácil: a satisfação é sempre temporária. Por mais que tentemos nos agarrar, a paz escapa por entre nossos dedos e nos colocamos em movimento de novo. Para piorar, parece que os prazeres que experimentamos nunca são iguais à primeira vez, em que ele é desconhecido e inesperado. Passamos por uma situação boa, mas ao buscá-la novamente, ela não é mais tão completa. Há sempre um quê de frustração. Para conseguir o mesmo patamar de bem estar, precisamos de mais e mais, enquanto a tendência da repetição é ter menos. Não é à toa que alguns psicanalistas tinham uma visão bastante pessimista sobre a existência humana: as nossas únicas opções são a insatisfação ou a resignação.
A fotografia, enquanto atividade humana, não está livre desse paradigma. A busca pela satisfação, pelo melhor possível, pela completude pode afetá-la em vários níveis, como na forma como lidamos com os equipamentos ou no ato fotográfico em si. O marketing de qualquer empresa, incluindo fabricantes de câmeras, sabem explorar isso muito bem. Para ter a melhor foto, precisamos da melhor câmera. Mas isso não existe. Mesmo que você compre a Leica ou a Hasselblad top de linha, a satisfação durará, no máximo, até o lançamento do próximo modelo top de linha que deixará a sua câmera obsoleta. E nunca os fabricantes lançarão um modelo completo, pelo simples motivo que, se o fizerem, não venderão mais câmeras.
Independentemente do equipamento fotográfico, também fazemos o possível pela melhor imagem. Viajamos grandes distâncias, esperamos pela melhor luz, ajustamos minuciosamente a configuração de um estúdio, procuramos as paisagens mais fotogênicas. Tudo pela fotografia perfeita. E, às vezes, conseguimos uma dessas, que acreditamos ser o ápice da nossa prática. Colocamos a foto na parede, recebemos elogios, postamos na internet e pipocam duzentos “curtiu”. E o que fazemos em seguida? Vamos procurar outra atividade? Damo-nos por satisfeitos? Não, passamos a pensar em repetir o feito, na próxima foto perfeita. Queremos trezentos “curtiu”, porque de repente duzentos já não parecem suficientes. E continuamos num ciclo sem fim. É esse mecanismo que faz a humanidade caminhar, sendo tão bem explorado pela lógica capitalista.
Há uma alternativa? Boa pergunta. Devemos desistir, nos resignar, parar? Talvez. A única coisa mais certa em relação ao que fazer com isso é ter consciência que a “foto perfeita” é inalcançável, pelas limitações da fotografia e pela nossa própria natureza insatisfeita. Teremos, no máximo, alguns momentos de glória que não perdurarão. Parece uma perspectiva pessimista, mas que também pode ser libertadora. Se a perfeição é inatingível, então podemos abrir mão de certas coisas: não precisamos mais do equipamento mais caro, da luz totalmente ideal, da paisagem mais estonteante. Podemos dar mais atenção e valor ao simples, ao ordinário, ao monótono. Afinal de contas, 99% da vida são feitos disso.