A onda das Toy Cameras persiste, com cada vez mais adeptos de um tipo de fotografia que vai contra e tendência tecnológica da fotografia digital e sem defeitos que os fabricantes de câmeras convencionais oferecem atualmente. O uso das “câmeras de brinquedo” geralmente está associada a uma fotografia compromissada com aspectos distintos, e por isso faz uso das características comuns a esses equipamentos: baixa nitidez e aberrações cromáticas por conta das lentes de plástico, vazamentos de luz, duplas exposições etc.
Entre os modelos mais cultuados está a Holga 120, uma médio formato que produz quadros de 56mm x 56mm, tem foco manual baseado em 4 posições fixas e seleções limitadas de abertura e tempo de exposição, variando de acordo com o modelo da câmera. O mais comum é que a lente tenha o diafragma fixo em f/8 e o obturador funciona em torno do 1/100 de segundo.
As principais críticas que vejo em relação às Holgas e similares feita pelos fotógrafos mais conservadores é que o seu uso não passa de um modismo é que o emprego dessas câmeras é a busca por um efeito fácil, pronto e vazio. Se é um modismo ou uma prática que veio para ficar, nas proporções em que está disseminada hoje, só o tempo dirá. E, de fato, as Holgas produzem imagens com um característica específica. Mas até aí, quando procuramos uma lente que seja extremamente nítida, também estamos procurando uma caraterística específica. Ou quando escolhemos um tipo específico de filme, de filtro ou aplicamos um recurso num programa de edição de imagens. Não é o efeito em si que é vazio ou significativo: é a coerência entre a característica técnica e o “discurso” fotográfico que dará sentido à escolha do equipamento. Procurar uma câmera que vaza luz ou uma lente com ótica perfeita é a mesma coisa quando não se sabe o que se fazer com uma ou outra.
As Holgas e suas similares têm, no entanto, uma vantagem. A fotografia como um todo é apenas um efeito, uma ilusão. É possível produzir fotografias cujos aspectos técnicos criam uma ilusão mais bem feita (lentes com alta qualidade ótica, nitidez, sensores com cores fidedignas etc.) ou pode-se deixar de lado essa preocupação e ter uma produção que mostra claramente que a fotografia é apenas um processo de interpretação. Ao propiciar isso, a Holga liberta o fotógrafo das amarras com a “realidade” e permite que ele dialogue com o processo, com o aparelho e com as suas próprias intenções. Cada vez mais as imagens dominam o mundo, e a escolha é entre apenas deixar-se hipnotizar por elas ou olhar para a forma como são feitas, coisa que é mais fácil com as toy cameras. Vejamos, então, alguns diálogos imagéticos com as Holgas (clique para ver maior).
Todas as imagens que ilustram esse texto foram utilizadas sob licença Creative Commons.
Rodrigo, definitivamente sou sua fã. =)
Durante um tempo também achei que o ponto alto da fotografia seria o mais alto grau de “perfeição técnica”, ou a maior semelhança com a realidade, o que quer que isso seja.
Depois de estudar semiótica, e estudar a fotografia em seus aspectos técnicos, bem como a história e os conceitos, mudei completamente de opinião. Fotografia é um registro sim, mas um registro de um olhar, e esse registro tem todo o direito de carregar uma personalidade própria.
Como disseste, o importante é que o fotógrafo tenha a consciência do uso das técnicas e equipamentos. Depois de receber elogios por uma foto granulada pelo alto ISO com o elogiador achando que era um filtro de photoshop, isso ficou bem mais claro na minha cabeça.
Oi, Tereza.
Acho que a maior parte das pessoas que começa a fotografar têm como objetivo, no início, a perfeição técnica. A fotografia tecnicamente bem feita encanta. No entanto, com o tempo, é quase inevitável que se questione o caráter representativo e passe a se dar mais espaço para a fotografia como interpretação. E aí, técnicas e equipamentos alternativos podem ser um caminho.
O importante é nunca perder essa noção de processo, de relação entre intenção, técnica e resultado. Nenhum equipamento ou técnica é bom ou ruim por si só; o que importa é a coerência da proposta.
Obrigado pelo comentário.
Filho dos negativos e agora do sistema digital, vi na minha Holga 120mm, a possibilidade de provar a mim mesmo, de que “inda” sou capaz de produzir sem o calço tecnológico.
Hoje coleciono uma quantidade de novas imagens onde meu discurso é mantido, ou mesmo tempo retocado pelo aspecto tosco da câmera.
A sensação de uma imagem que encanta tanto pelo assunto em si, quanto que pelo desequilibro da luz e nitidez me seduz e me aproxima de uma imagem mais subjetiva, porem, cheia de significados.