Sair e procurar por uma foto é a forma errada de pensar [a fotografia]. Você deve apenas ter uma vida interessante, e contar a história apertando um botão.
Cole Rise
Talvez seja possível dividir a nossa atitude em relação ao fotografar em dois modelos. Modelos são sempre concepções artificiais que não são de fato a realidade, mas que podem nos ajudar a organizar conceitualmente aquilo que observamos. Então, não os levemos muito a sério, mas vamos nos deixar conjecturar um pouco nesse jogo mental.
No primeiro modelo, buscamos ativamente a foto. Saímos especialmente para fotografar, planejando os locais que podem proporcionar boas fotos. Imaginamos as fotos que vamos tirar e adequamos o equipamento ou até a hora do dia para nos aproximarmos do resultado que concebemos. Podemos encaixar nesse grupo também a fotografia preparada num estúdio ou em situações controladas. O fotógrafo age como uma espécie de caçador — ou, sendo menos negativo, um criador — que busca concretizar a sua ideia.
O outro modelo, que é o preferido do fotógrafo que citei no início do texto, é aquele em que apenas se vive e a fotografia serve para contar, em forma de narrativa visual, um pouco daquilo que se vive. A fotografia não vem antes, não está pré-concebida: ela acontece a partir do que já está lá, como um reconhecimento à beleza ou ao que é interessante no viver em si. O fotógrafo, nesse caso, é um observador. A câmera é quase um acessório, uma extensão do olhar contemplativo do fotógrafo.
Ao contrário do que diz a citação inicial, acho que não existe jeito certo ou errado de pensar ou fazer a fotografia. “Maneiras certas” são conceitos e, como tais, variam de acordo com as cabeças que os elaboram. Quando começamos a argumentar que existe uma maneira certa de se usar uma ferramenta, ou de se criar — e geralmente o jeito “certo” é o jeito de quem está argumentando — perdemos a capacidade de admirar e valorizar aquilo que é diferente. Ser capaz de gostar daquilo que eu não faria, a partir da compreensão do outro, é habilidade importante no nosso momento atual, em que as nossas pequenas diferenças nos separam tanto.
O máximo que posso fazer é uma autoanálise, ao olhar para a forma como transitei dentro desses modelos. Percebo que quando comecei a fotografar, estava mais identificado com o primeiro, buscando ativamente as fotos. A fotografia era uma atividade voltada para um resultado, satisfatória quando ele era obtido e frustrante quando não. Ao longo do tempo, passei gradualmente para o segundo. Percebo hoje, mais observador, que as fotos que faço são menos interessantes visualmente, menos impactantes, menos extraordinárias e menos conceituais. Talvez até menos criativas. Por outro lado, sinto que as fotos atuais são mais sinceras, pois refletem, simplesmente, o que vivo.
Foto do cabeçalho: Tiago Costa
Sem dúvida alguma me encaixo no exemplo 2.
Um grande abraço, Rodrigo.
Obrigado pelo depoimento, Peri. Um abração.
Quando iniciei na fotografia amadora era mais o estilo “camera me acompanhando”, já hoje, principalmente por estar voltado à intenção de me “profissionalizar”, comercializar o trabalho, volto minha forma de fazer para algo que traga um resultado mais calculado, então me tornei caçador. Ao menos tento registrar as coisas que sempre vi e me chamaram a atenção, ou fizeram parte de mim, só que de forma que a estética fique mais interessante ou comercial. Muito bom o texto ( como todos )! Muito obrigado!
Muito obrigado pela leitura e pelo relato! Um abraço.
Olá Rodrigo, muito bom o seu texto!
Pois é, estou deixando do caçar imagens também…hmm…e isso é bom! ^^
Eu não sei se você já leu um livro chamando ‘Desenhando Quadrinhos’ de Scott McCloud.
Existe uma parte no livro em que o autor se dedica a analisar e a classificar os tipos de fazer quadrinhos: mas especificamente, os valores os propósitos que movem a sua arte. O mais interessante é que, de você analisar bem, a classificação que ele fez vale para todo o tipo de arte, incluindo aí a fotografia.
Eu acho que vale à pena dar uma conferida. Lá fica bem evidente que não existe jeito certo ou errado de fazer arte, mas que cada um está buscando um ideal diferente.
Um abraço Rodrigo!
Gostei muito da reflexão, mas, eu te pergunto: E porque não transitar livremente entre os dois?
Muito bom texto, faz viajar. Os dois modelos acredito serem fundamentais, mas o 2 é o que prefiro.
Parabéns .