Recentemente, comentei aqui sobre uma fotografia aberta ao acaso, voltada mais a provocar impressões do que ser simplesmente representativa, e das dificuldades em se estabelecer os limites conceituais e práticos. Nas últimas semanas, continuei procurando fazer esse tipo de fotografia, experimentando especialmente as baixas velocidades do obturador e as múltiplas exposições.
Nos dois casos, há margem para o imprevisto. Ao usar baixas velocidades, não se sabe exatamente que efeito o movimento causará. Além dos borrões óbvios, os pontos em que o movimento é mais lento ou cessa ficam marcados no fotograma, multiplicando a presença do objeto.
Na primeira linha de fotos (coloridas), utilizei uma câmera reflex digital, ISO 200, modo de prioridade de velocidade, ajustado em cerca de meio segundo. A abertura variou de acordo com o programa da câmera, mas sitou-se em torno de f/11 e f/16, o que levou a um foco longo (que não se vê pelo movimento) e até ao destaque para as sujeiras no sensor.
Já no restante (preto e branco), fotografei com uma câmera reflex analógica, com filme ISO 100 e lente de 55mm. Configurei o fotômetro para ISO 200 no caso de duplas exposições, ou ISO 400 no caso de exposições múltiplas. Uma das fotos é a sobreposição de várias inscrições na lateral de um edifício. Em uma delas lê-se “só para loucos”, que me remeteu ao livro de Herman Hesse, O Lobo da Estepe, em que o personagem principal adentra o Teatro Mágico, que é descrito por essa expressão (e daí o título deste artigo).
As duas séries são bastante diferentes entre si e se afastam da fotografia convencional. São melhor definidas por imagens produzidas por câmeras fotográficas, utilizando recursos já programados nas máquinas, mas em contextos que levam a um resultado permeado de imprevisibilidade. Embora sejam técnicas pra lá de antigas, ainda há quem se surpreenda com os efeitos obtidos. É possível, a partir delas, manter a discussão dos limites da fotografia, ao se perguntar onde se situa tudo aquilo que a câmera fotográfica é capaz de fazer.
Adoro esta loucura toda :))
quando nos propomos a produzir algo intelectual, é necessário controle. ou pelo menos, pensamos assim. a máquina fotográfica é para mim um elemento de controle quase inquebrável da técnica e do próprio autor. há uma dualidade, o autor controla a camêra e ela controla uma série de outros fatores. controle sobre controle. o que você busca nas suas fotos é deixar que a cena traga os resultados, quando deixa os movimentos serem impressos ou quando mistura momentos diferentes e cenas diferentes em uma só composição. tem semelhança com o que eu busco nas aquarelas, que a água e a tinta sejam os resultados, não que eu as domine e controle totalmente, mas que mão, pincel, água e tinta sejam como um só. como na fotografia, nem todos preferem assim, há também na pintura com aquarela a procura de controle total da técnica e resultados “perfeitos”, realistas ou no mínimo equilibrados. De forma peculiar, acho que as suas fotos das aquarelas estão em sintonia com o que eu tentava fazer naquele momento. Deixar estar, ser.
Apesar de já ter visto as fotos, gostei do formato quadrado delas (P&B). Talvez pela simetria dada as fotos, mas o fato é ultimamente tenho gostado mais dos formatos mais quadrados do que dos mais retangulares. Quando cliquei para abrir em tamanho maior, infeizmente, elas foram mostradas no formato original.
É, uma limpezinha na câmera cairia bem apesar de que deram um charme nas fotos.
Rodrigo, parece que o interesse pelo impressionismo está a crescer em você, o que acho muito bom!
Tens experimentado fotografar sem olhar pelo visor? É a fronteira final.
[…] texto publicado no site Câmara Obscura, Rodrigo F. Pereira reflete sobre a complexidade presente no momento em que o fotógrafo decide […]
[…] texto publicado no site Câmara Obscura, Rodrigo F. Pereira reflete sobre a complexidade presente no momento em que o fotógrafo decide […]
Tudo aquilo que a câmera fotográfica é capaz de fazer situa-se na nossa imaginação, caro Rodrigo. Eu sempre pensei – e penso- que na arte fotográfica o acaso leva grande parte, ainda que seja num trabalho do Ansel Adams, com amplo espaço para a conceituação e técnica depurada.
Considero também que o acaso tem maior possibilidade de estar presente entanto trata-se de fotografias onde o movimento – de pessoas ou objetos- esta presente.
Quer dizer, temos no ato de fotografar uma dualidade, o melhor, uma tripla dualidade, que é definida pelas relações sujeito-objeto, sujeito-sujeito e objeto-objeto.
O sujeito não é unicamente o fotógrafo, quer dizer, o subjetivo não fica só nele, porque ele no é o único fator ativo no ato de fotografar, nem também o único a ter condições de subordinação.
Ao sujeito é atribuída condição substancial e faculdade cognoscente, mas também transformações, qualidades ou acidentes. Já o objeto é reduzido a qualquer uma realidade suscetível de ser conhecida pelos sentidos que ativa o sujeito – no caso o sujeito é apropiador-, quer dizer, no sentido mais positivo, é coisa material que pode ser percebida sempre de forma imutável.
Mas será que é assim mesmo na fotografia, caro Rodrigo?
Será que aquela tripla duplicidade que falei é só uma invenção sem sentido? No temos, acaso, nas suas fotografias a presença dela?