Keiichi Tahara: um artista da luz

Keiichi Tahara é um artista japonês que trabalha com a luz. Embora tenha iniciado sua carreira trabalhando com fotografia e como operador de câmera de vídeo, sua trajetória deixa claro que ter a luz como objeto de criação vai muito além de registrá-la. É dele uma das fotografias que mais me impressionou na exposição dos 20 anos da NAFOTO, em cartaz na Caixa Cultural da Praça da Sé, em São Paulo, até o dia 3 de julho.

O início da sua carreira, nos anos 70, revela uma relação de intriga com a luz, primeiro nos prédios de Paris, cidade para a qual acabara de se mudar, em seguida nas janelas e, por fim, nos retratos. A imprecisão das suas paisagens e ambientes internos, sempre num preto e branco de base escura, deixa claro que sua protagonista é a iluminação, muitas vezes escassa e esparsa, que se esgueira através das sombras.

Após uma série feita em Polaroid, Tahara passa a trabalhar, nas últimas décadas, com esculturas de luz e instalações, apresentadas em diversas cidades da França e do Japão. No entanto, embora suas obras físicas tenham atingido uma outra dimensão artística, suas fotos ainda são contundentes, ao mostrar um mundo paralelo feito de luz e sombra.

Para conhecer o trabalho do artista, acesse o site oficial: Keiichi Tahara.

Alexandre Berner: cor e paisagens

O geólogo Alexandre Berner, de Petrópolis, começou a se interessar por fotografia durante a sua graduação. Desde então, vem usando as câmeras para aprimorar a sua sensibilidade e mostrar como interpreta a paisagem natural, além de almejar proporcionar um melhor convívio das pessoas com o planeta. Eu já havia citado o seu trabalho ao falar sobre a série de fotografias do Rio Xingu, mas desde então seu portfólio cresceu, em quantidade e qualidade.

Berner é especialista em  paisagens, como mostra em fotografias exuberantes de sua terra natal. Seu gosto pelo montanhismo também fica evidente nas imagens de serras e trilhas, cujo diferencial é a exploração das cores, aliada à excelência técnica. Tal ênfase atinge seu ápice nas fotos do meio-oeste americano, em que ele não hesita em explorar as sombras para mostrar os detalhes da paisagem.

No entanto, a fotografia de Berner não se limita aos ambientes naturais. Um dos seus trabalhos mais expressivos é a série Reflorestamento em Manaus, em que ele usa os grafites com temas da natureza em meio ao cinza da cidade, criando um contraste irônico e pungente.

Seguem alguns exemplos das suas fotografias, junto com o convite para a visita do seu portfólio completo: Alexandre Berner no Photo.net.

Precisamos de novos modelos

Bons fotógrafos profissionais tendem a ter uma série de nomes consagrados que usam como modelos para o seu trabalho, geralmente dentro de sua área. Fotógrafos de moda, de casamento, publicitários costumam estudar o portfólio de quem tomam como norteadores. Procuram assimilar as técnicas, buscar os mesmos recursos e obter resultados semelhantes, aprimorando, assim a sua própria fotografia. Quando se é profissional e quando se trabalha numa área específica, é mais fácil ir atrás dessas referências, em sites, revistas especializadas, agências etc.

Já o fotógrafo amador não tem uma direção clara, já que ele pode simplesmente fazer de tudo. Então, em quem se espelhar, quem ter como modelo? Ao buscar a sua referência, o fotógrafo amador geralmente se depara com duas armadilhas que o levam a uma prática deficiente: se espelhar em profissionais cujo sentido do trabalho é totalmente distinto do seu ou se fechar em apenas uma vertente de possibilidades e nomes — e comumente as duas coisas acontecem juntas.

O amador pode, então, tomar emprestados aspectos da fotografia profissional que não fazem sentido na sua prática. Ele pode, por exemplo, não fazer pós-processamento em suas fotos por essa ser uma prática pregada por veículos jornalísticos. No entanto, há um sentido nessa exigência dentro do contexto profissional, que é preservar a credibilidade das informações. Para o amador, a menos que ele tenha algum tipo de blog investigativo, ou alguma outra justificativa, não faz sentido atuar assim. Ou seja, aquele que não fotografa profissionalmente deve adequar a sua prática às suas intenções e ao seu objetivo na fotografia em vez de apenar imitar preceitos que não lhe dizem respeito.

txiribiton
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Ao longo da sua história, a fotografia deve ter tido centenas ou milhares de grandes fotógrafos. Pessoas que conseguiram mostrar um lado surpreendente do mundo, encantar com composições surreais, usar o processo fotográfico em prol da estética ou simplesmente retratar a poesia do cotidiano. No entanto, muitos amadores parecem ter um certo fetiche por três nomes: Henri Cartier-Bresson, Ansel Adams e Sebastião Salgado. Três ícones, sem dúvida, mas que ao se estabelecerem no imaginário do fotógrafo amador avançado como referências arquetípicas, ofuscam a significância de muitas outras referências importantes e que, se fossem consideradas, abriram horizontes para os amantes da fotografia.

Salgado e Bresson são, basicamente, fotojornalistas, ainda que suas fotografias tenham adquirido status de arte (coisa que provavelmente não tenha dominado suas preocupações). Ou seja, a sua prática é ir ao mundo e mostrá-lo como tal, como um observador não participante, que não interfere. Embora seus trabalhos sejam fantásticos, quantos amadores têm um subsídio financeiro para flanar por Paris? Quantos visitarão um terço dos lugares pelos quais Salgado passou? Para completar, quantos carregam Leicas a tiracolo? Então, qual é o sentido de fechar os olhos para outros referenciais que podem tanto mostrar outras possibilidades com a fotografia como envolver práticas mais condizentes com suas realidades?

Já Adams fotografava pela estética, levada a um extremo técnico de câmeras de grande formato e um sistema complexo de captura e revelação.  E voltamos à pergunta, quantos amadores andam por aí com suas máquinas 4×5 e tem a sorte de ter acesso regular a um parque nacional como Yosemite?

É claro que é possível usar esses nomes como fontes de inspiração, mas ter fotógrafos com práticas tão distintas como única referência levará o amador a uma simples mímica, a um arremedo. Cada um precisa construir uma prática condizente com as suas possibilidades e, nesse caminho, buscar referenciais palpáveis, sejam eles grandes nomes ou não.

E aqui vão algumas ótimas fontes das quais pode se beber dos mais diversos tipos de fotografia. O grupo Young Photographers United reúne novos talentos de todas as partes do mundo. O site Fotografia Contemporânea reúne na página Fotografias de Autor ensaios para todos os gostos. No Brasil, temos grupos como o coletivo fotográfico Púnctum e o F/508, este último tendo revolucionado o fotoclubismo nacional. E viva a multiplicidade de possibilidades que a fotografia nos dá.

O fotojornalismo subversivo de Ivars Gravlejs

O fotógrafo tcheco Ivars Gravlejs desenvolveu, durante um ano e em segredo, um projeto de arte contemporânea enquanto era repórter fotográfico do jornal Deník. Ele manipulava sistematicamente detalhes de suas fotos antes de enviar para publicação, e depois criou uma exposição com os recortes de jornal contrapostos às fotografais originais. O trabalho é extremamente interessante e relevante, uma vez que estamos vendo uma mídia histérica com o Photoshop que insiste em vender a imagem da fotografia como reflexo da realidade.

O próprio autor descreve o projeto “My Newspaper”:

“Todos os dias eu recebia, de editores e jornalistas, a incumbência de fotogravar eventos em Praga. Antes de enviar as fotos para o banco de imagens do jornal, eu rapidamente as manipulava no Photoshop. Originalmente, a idéia era mudar alguns detalhes pequenos e desimportantes, que não alteraria muito o conteúdo da fotografia, como por exemplo adicionar mais botões na camisa de um escritor ou adicionar uma pichação na parece. No entanto, durante o processo, houve algumas mais radicais, como criar um congestionamento numa estrada ou cortar o dedo do cantor José Carreras. O objetivo desse projeto foi criar manipulações absurdas a partir das manipulações da mídia.”

O artista Milan Mikuláštík comenta o trabalho de Gravlejs:
“O projeto é um exemplo típico de ‘arte subversiva’. É uma arte que parasita o tema concreto e afeta, sabota e critica esse tema (no caso a sociedade midiática). Por um lado, Ivars Gravlejs desconstrói a autoridade do negócio midiático, desconstrói a autenticidade e a objetividade da informação (que é, de qualquer forma, já midializada e interpretada), mas por outro lado ele contempla a situação do artista contemporâneo, que frequentemente precisa suspender seu processo criativo a fim de ganhar dinheiro para viver. Gravlejs cuidadosamente ‘contrabandeou’ sua arte na sua atividade ‘não artística’ diária.”

Ivars Gravlejs

Ivars Gavlejs

Sobre o exemplo acima, o artista descreve:
“No dia 31 de agosto eu deveria fotografar um congestionamento. Fui até o local, mas não havia congestionamento. Para fazer a foto, eu poderia jogar um tijolo na estrada ou escolher a maneira menos dolorosa — ir para casa e fazer a foto em paz. Os assuntos mais importantes para o jornal ‘Deník’ eram congestionamentos, ruas e parques sujos, moradores de rua, estrangeiros e o tempo.”

Isso nos leva a refletir sobre a cadeia de produção de informações. O fotógrafo precisa fazer uma foto que satisfaça o repórter, que segue uma linha editorial feita para agradar os leitores do veículo. Quem faz finge dizer a verdade e quem lê finge acreditar. E quando alguém expõe a artificialidade do processo (e a fotografia jornalística é uma entre diversas artificialidades tomadas como verdades), há uma reação histérica em defesa da objetividade e da imparcialidade santa dos meios de comunicação.

Mais no site do artista: Ivars Gavlejs.

Fotografia japonesa

Nas últimas semanas, tenho pesquisado, de forma relativamente sistemática, o trabalho de alguns fotógrafos japoneses. Após tomar contato com o as fotos de Toru Aoki publicadas no I Heart Photoghraph, que me chamaram muito a atenção, fui em busca de outros autores, percebendo que parece haver algumas qualidades específicas na fotografia japonesa, que vão desde a natureza contemplativa de algumas imagens até a crítica de costumes em fotografias com teor sexual explícito. Não pretendo fazer nenhum tipo de análise do trabalho desses artistas, uma vez que seria necessária uma compreensão maior do contexto em que eles se inserem; apenas apresento quatro fotógrafos de épocas e estilos distintos e suas produções.
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“Distorções” e outros ensaios de Eduardo Buscariolli

Se tem algo que gosto nas fotografias experimentais de Eduardo Buscariolli, do Grupo Câmara Obscura, é que elas nos apresentam diretamente os problemas teóricos da fotografia, como um tapa na cara. Na breve série “Distorções”, não é diferente. Eduardo fotografa objetos do cotidiano usando diversos materiais entre a câmera e o referente, com o objetivo de criar novos tipos de representação.

O trabalho de Eduardo mexe diretamente com o caráter, a matéria da fotografia, uma vez que expõe a fragilidade com que a câmera busca representar o referente. Como estamos muito acostumados com a transformação que a câmera faz, não percebemos que a fotografia não é a realidade. Ao decompor os objetos, especialmente os mais banais, Eduardo diz, a la Magritte: Isto não é um cachimbo.

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A melhor foto

O pessoal do 508 criou uma série, no blog deles, chamada “A melhor foto”. A idéia é convidar alguns fotógrafos profissionais e amadores a escolher, entre a sua produção, qual é a sua melhor foto e eleborar um texto explicando os motivos pelos quais a imagem foi eleita. Invariavelmente, os autores relatam a dificuldade nesse processo, já que quem faz a foto tem um tipo de visão e envolvimento com a própria produção que talvez não fique claro para quem apenas vê o resultado pronto. Ainda assim, é algo interessante, e essa chamada direta do pessoal do fotoclube dá aos fotógrafos a oportunidade de olhar para o próprio trabalho se forçando a ter algum tipo de critério em mente.

Eu fui um dos convidados a participar, e fiquei em dúvida entre duas fotos. Uma, que foi a escolhida, é uma dupla exposição que fiz à noite no centro de São Paulo, mas precisamente na esquida do Viaduto do Chá com a Rua Libero Badaró. Decidi submeter essa pois era mais representativa da minha produção e do tema que abordo com mais frequência, a cidade e as impressões de se vivier nela. Essa foto inclusive já havia estado numa exposição coletiva do Sampa Fotoclube, ampliada em 30x40cm. Para ver a foto e o relato, acesse o blog do 508.

A foto preterida foi uma da série Passagens, que fiz sob o Viaduto Boa Vista, num sábado pela manhã. É uma imagem meio borrada de uma mãe carregando o seu filho no colo. Essa foto teve inclusive maior aceitação do que a escolhida, mas nem sempre o que tem mais aclamação é o que consideramos mais relevante, embora eu goste bastante dessa imagem. Algo que pesou é que ela faz parte de uma série, e é estranho mostrá-la isolada das outras, enquanto na que foi para o blog não havia essa preocupação, sendo mais adequada para uma escolha única.

A série está sendo publicada às segundas-feiras e até o momento, além de mim, participaram Patrick Grosner, Boris Kossoy, Fernando de Tacca e Fernando Rabelo. A listagem completa pode ser acessada na seção A Melhor Foto do blog do 508.

O Verbo de Fernando E. Aznar

O fotógrafo Fernando E. Aznar, que faz parte do Grupo Câmara Obscura, lançou um novo trabalho em formato digital, VERBO, mesclando fotos e música. O autor descreve a apresentação:

Vinde a Voz

Imagens nunca foram tão caras ao mesmo tempo que tão públicas: custam tanto empenho dos RP para midiatizar seus clientes e a gente comum as oferece indistinta e gratuitamente pela web detalhes íntimos do dia-a-dia familiar … mas nem tudo são imagens. Estas são ferramentas etéreoeletrônicas contemporâneas, de acesso cada vez mais amplo mas ainda distantes da maioria da gente sem voz, que não foram educados pelos corretos maus modos. Resta-lhes o manifesto, onde e como for, deixando um sinal de que ainda respiram e interagem, são parte, não aceitam ser apenas réus e clamam ação civil. O “Todo” que entenda a mensagem, resmungue, ria e espume, discrimine e criminalize, arranque a placa, repinte o muro. Mas será obrigado a pensar agora, e quem sabe sentir amanhã, quando ruminar. Continue lendo “O Verbo de Fernando E. Aznar”

Flávio Varricchio mostra os pescadores do RS e seus jipes

O fotógrafo Flávio Varricchio realizou, no início do ano, um ensaio com pescadores do litoral norte do Rio Grande do Sul, que usam jipes para puxar as redes. As imagens, capturadas em câmera digital com lente grande-angular, mostram a rotina dos trabalhadores na praia, numa abordagem extremamente próxima e beneficiada pela plasticidade da luz e da vastidão das areias da praia.

O autor fala sobre o ambiente em que o ensaio foi realizado:

“Para quem não conhece o litoral gaúcho é uma reta de 500km de areia dura e plana, só quebrada pela barra da Lagoa dos Patos em Rio Grande e pelos paredões de basalto em Torres na divisa com Santa Catarina.

Mar escuro, que chamam de toddynho pela cor da água parecer um chocolate em grande parte do ano, varrido por ventos fortes, nordeste no verão e o famoso e gelado minuano no inverno.

Um litoral não tão paradisíaco como o de outras regiões do Brasil, mas muito bonito, pelas inúmeras lagoas a beira mar e dunas de areia muito branca.

São praias onde se sente a solidão e os extremos da natureza, onde se anda dezenas de quilomêtros sem se ver uma pessoa, só na companhia das inúmeras aves e de pinguins e leões marinhos que costumam aparecer em suas areias no inverno, além do vento, companhia constante seja em que época for”.

O autor organizou as imagens em slideshow com trilha sonora. Você pode conferir esta apresentação na página do Flávio Varricchio aqui mesmo no Obscura.

“Light Paintings” de Toby Keller

Existem na fotografia algumas técnicas cujo uso indiscriminado e os resultados sistematicamente iguais transformam-nas em clichês automáticos ou meras brincadeiras. Uma delas é a light painting, ou pintura com a luz. Ela é feita geralmente colocando-se a câmera em um tripe em um ambiente de baixa luminosidade e usando o flash ou objetos luminosos para produzir efeitos como riscos, textos ou manchas de luz em locais específicos. Até hoje, nunca tinha visto nada de muito interessante feito com esse procedimento, apenas brincadeiras que causam um certo impacto inicial mas sem força para se manter como boas fotos.

Procurando imagens para outro artigo, encontrei o trabalho do fotógrafo americano Toby Keller. Especializado em fotos noturnas, especialmente de paisagens, ele utiliza a técnica com critério e equilíbrio, criando imagens interessantes. Muitas delas tem um forte apelo geométrico e composições bem estruturadas e, embora algumas pareçam um pouco excessivas, a maior parte do trabalho de Keller mostra que é possível fazer da light painting uma técnica criativa, como parte da imagem, e não apenas como uma protagonista de gosto duvidoso.

Esse tipo de trabalho é importante para nos lembrar de duas coisas: a primeira é que nenhuma técnica pode ser considerada simplesmente boa ou ruim; é a sua adequação à proposta do autor que a torna boa ou ruim. Conceber um trabalho coerente deve ser a priemira preocupação de um fotógrafo autoral, mais do que a utilização indiscriminada de um método sem considerar se o mesmo funciona dentro do que está sendo feito. O segundo aspecto é o valor criativo da fotografia, em que uma cena é construída a partir de técnicas e intenções, em oposição à fotografia “passiva” em que se registra algo que acontece naturalmente.

O trabalho de Toby Keller pode ser conferido na íntegra em seu site. Abaixo, uma galeria com imagens do autor reproduzidas sob licença Creative Commons.