Menos é mais

Num mundo em que há tantas imagens sendo produzidas a cada instante, pode-se perguntar: o que fazer para se destacar? A resposta a essa pergunta dependerá da sua área de atuação. Caso você seja um profissional, é preciso encarar a fotografia como um produto e aplicar a lógica do marketing a essa atividade. Caso sua aspiração seja ser um artista, o que contará é sua rede de contatos e a sua persistência para emplacar seus trabalhos. Se você for um amador, você não precisa se preocupar com isso.

O que há de comum entre as três possibilidades? Nos dias atuais, a qualidade da fotografia produzida é um mero detalhe dentro de outros fatores que são determinantes do sucesso profissional e artístico. No mercado de serviços fotográficos, a forma de promover o seu trabalho provavelmente terá mais impacto do que boas fotos, já que com equipamentos cada vez mais avançados e recursos automáticos mais eficientes, a variação de qualidade técnica acaba sendo mínima. No mercado artístico, há tempos em que as características das obras em si já não importam muito, dando lugar a pontos como o quanto você aparece e quem você conhece. Não que ser um bom fotógrafo seja totalmente irrelevante: ajuda, mas não é o essencial.

Quando se é um amador, não adianta tentar lutar contra a avalanche de imagens sendo produzidas e publicadas a cada segundo. Mesmo que se consiga algum destaque, ele durará menos de quinze minutos – talvez quinze segundos – de modo que talvez seja mais útil pensar a fotografia como tendo uma função extremamente pessoal. Como já comentei antes, buscar esse tipo de reconhecimento pode ser extremamente nocivo para seu trabalho fotográfico, pois a tendência é transformá-lo naquilo que os outros querem ver. E, no fim, você nunca estará satisfeito.

Se você conseguir abrir mão da necessidade por esse tipo de aprovação, pode fazer algumas coisas para tornar sua fotografia mais significativa, ainda que apenas para você. Uma delas é reduzir. Se as pessoas produzem milhões de fotos por segundo, cada uma delas vale pouquíssimo em termos de significado e mesmo como produto de um processo artístico ou de comunicação. Se você produzir menos, suas fotos valerão mais – não em termos de valor econômico, mas de valor em termos de significado. Reduzir, então, quer dizer diminuir o número de fotos, de câmeras, lentes, acessórios, impressões e publicações das imagens na web. Algumas coisas que podem ser feitas dentro dessa proposta:

1. Tirar menos fotos. Se você conseguir controlar o seu dedo e planejar mais antes de cada clique (talvez imaginar que você está fotografando com filme ajude), não só você terá chance de estudar o melhor ângulo, o melhor momento, a melhor luz, mas também terá mais chance de viver a situação sem colocar a câmera entre você e o mundo a cada instante. Um bom fotógrafo conhece aquilo que fotografa, e isso toma tempo.

2. Restringir o equipamento. Esqueça tripés, flashes, filtros ou qualquer outro acessório. Uma câmera, uma lente e um cartão de memória (ou um rolo de filme) são suficientes para fotografar. Carregar muitas lentes e acessórios fazem com que você se preocupe mais com eles do que com o que será fotografado. O resultado geralmente são fotos tecnicamente corretas mas sem graça, em que fica evidente a distância entre o fotógrafo e o assunto. Não foque seu pensamento naquilo que você poderia fazer se estivesse com a lente X, e sim como o que está sendo fotografado é interessante e de que maneira você vai querer transpor esse assunto em uma fotografia.

3. Tratar cada foto individualmente. Resista à tentação de usar uma action ou um preset nos programas de edição de imagem e aplicá-los a todas as fotos. Em vez disso, selecione as fotos que mais agradaram e realize o pós-processamento uma por uma. Ao gastar tempo com cada uma delas, em vez de inseri-las numa linha de produção automatizada, você estará aumentando o seu valor. Além disso, terá muito mais flexibilidade e poderá dar a cada foto o que ela precisa em termos de tratamento.

4. Publicar menos. Mesmo que você tenha feito uma foto fantástica, que o faça ter vontade de mostrar imediatamente para todo mundo, considere as alternativas. Ainda que sua foto atraia uma série de elogios e comentários, em 30 segundos outra imagem fantástica aparecerá, fazendo com que todo mundo esqueça a sua. Isso poderá diminuir o valor da sua fotografia, ou pior, fará com que você também a esqueça, ao impulsioná-lo(a) a fazer uma nova foto fantástica que renderá mais 30 segundos de fama. Ou seja, ao invés de contribuir com a torrente de imagens, você pode considerar suas fotos como pequenos tesouros que você mostra apenas para poucas pessoas que saberão apreciá-lo.

Se você gosta de fotografia, provavelmente passará o mesmo tempo no processo fotográfico, mesmo que faça o que foi sugerido na lista acima. Desta forma, em vez de gastar poucos segundos com cada imagem, passará a concentrar-se nela por um grande período de tempo, desde o planejamento até a publicação. Isso não apenas resultará em fotos mais trabalhadas, mas também fará com que cada uma assuma um significado maior. Suas fotos se tornarão mais relevantes, mesmo que seja só para você.

Reduzir a quantidade não fará com que as pessoas prestem mais atenção em você – esqueça isso – mas com que você consiga valorizar mais cada foto e selecionar melhor os assuntos que valem um clique, o arquivo que vale um pós-processamento, a foto que vale uma publicação ou a imagem que vale uma impressão. No fim, pelo menos você poderá ter uma seleção do seu melhor, resgatando a qualidade da fotografia, especialmente no que se refere ao significado, que está tão em baixa nos dias de hoje.

Fotos de futurowoman

7 comentários em “Menos é mais”

  1. “Less is more” é o meu lema.

    Só não consigo ainda reduzir muito a quantidade de fotos produzidas em um evento, por exemplo. Ainda fico fascinada com as milhares de possibilidades que uma boa e animada festa infantil pode render, principalmente quando a decoração ajuda =)

    Mas, como exercício, tenho feito uma edição mais criteriosa do material a ser entregue, primando mais pela qualidade do que quantidade mesmo.

    É mesmo uma prática reveladora, quase um caminho de descoberta interior. Aprender a olhar mais, pensar mais, planejar mais, e executar menos.

  2. Preciso deixar registrado que as reflexões que encontro neste blog me ajudaram, e muito, a (re)pensar a fotografia.
    Um dos poucos blogs que pensam fotografia de maneira lúcida, com uma linguágem acessível.
    Para além do fetiche, a fotografia vive.

  3. Fico feliz em saber que o seu post está em total consonância com os diálogos fotográficos que tivemos ontem à noite. Para quem você fotografa? Quem você quer agradar? Pois bem, fotografo para mim, para o meu momento ou meus ideais. Pouco importa como imagem saia, desde que ela seja verdadeira.
    Mais uma vez, obrigada pelas boas reflexões.
    Abs,
    Rose

  4. Olá Rodrigo.
    Fico feliz pelo fato de você estar produzindo textos constantemente no blog.

    Mais um texto que nos faz refletir sobre o ato fotográfico.
    Obrigado e parabéns.

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