A fotografia mudou (de novo)

Relatórios recentes indicam que a venda de câmeras caiu vertiginosamente nos últimos anos, sejam compactas, reflex ou mirrorless. Após o surgimento das máquinas fotográficas digitais, parece ter havido uma febre por equipamentos que vem se esfriando com a popularização de celulares e a melhora na qualidade das fotografias produzidas por eles.

Sejamos honestos: tirando aquelas que são muito ligadas em fotografia, a maioria das pessoas não liga para a diferença no resultado de uma câmera dedicada e de um celular — ou, mesmo que ligue, não está disposta a abrir mão da praticidade e portabilidade de um telefone. Não sei se os fabricantes de equipamentos estavam preparados para isso ou não, mas o fato é que hoje as câmeras dedicadas estão se tornando um objeto que só os profissionais e poucos entusiastas ainda usam. O mercado de equipamentos fotográficos está se transformando num nicho restrito, talvez como seja hoje o mercado de filmadoras: praticamente só os profissionais usam.

Com isso, estamos vendo as empresas se retirando do mercado nacional, marcas de equipamentos sendo compradas ou fundidas, fóruns de discussão sobre fotografia na Internet definhando, escolas de fotografia tendo dificuldades para obter novos alunos e tendo que se reinventar. A economia em torno da fotografia está precisando se adaptar à redução natural de interesse por parte das pessoas.

O que não quer dizer, no entanto, que as pessoas estejam fotografando menos. Ao contrário: hoje a rede social que mais ganha relevância é o Instagram; aparelhos celulares são avaliados pelas suas câmeras, sendo que novas tecnologias vêm sendo lançadas, como câmeras duplas, câmeras frontais, HDR, ativação por voz e assim por diante. Nunca se fotografou tanto.

Piotr Mamnaimie

O hábito de tirar fotos está totalmente integrado à nossa rotina. Entretanto, ele é tão automático que quase não percebemos que estamos fotografando. Abrimos a câmera do celular, enquadramos e apertamos um ícone na tela: pronto. De lá a imagem vai direto para os amigos ou para as redes sociais. Se na época do filme havia todo o processo de revelação e na das câmeras digitais havia ainda o processo de baixar as fotos para um computador, processá-las e compartilhá-las, hoje até esse caminho se tornou arcaico. Fotografar, revelar e mostrar as fotos para outras pessoas era um processo que já levou dias; hoje leva segundos.

Há muita discussão sobre se o automatismo e a velocidade de produção de fotografias é algo bom ou ruim. Debater não muda muita coisa: as coisas simplesmente são assim. Ainda há espaço para quem gosta de fazer uma fotografia artesanal, até mesmo usando filme. Há espaço para quem gosta de usar câmeras digitais dedicadas e editar cuidadosamente as imagens no computador. E há também para a grande maioria que fotografa se aproveitando da praticidade dos smartphones.

Embora a forma como se fotografa faça parte da mensagem, o aspecto mais importante da fotografia é o que se fotografa. O conteúdo, a narrativa, a expressão são o que dão peso à fotografia. Por muito tempo temos confundido saber fotografar com saber operar uma câmera. Se isso já era uma concepção enganosa, agora se torna ainda mais. Os automatismos dos celulares permitiram à muitas pessoas despreocupadas com técnicas produzirem conteúdos extremamente relevantes. Esses não são fotógrafos menores; ao contrário, são fotógrafos conectados com a essência da fotografia: o assunto.

 

Foto do topo: ythedarkdays

Como escolher uma câmera

Câmeras fotográficas estão se tornando um produto de nicho. Como hoje todo mundo fotografa com os celulares, que têm câmeras cada vez melhores, a fabricação e venda de equipamentos exclusivamente fotográficos está caindo. É possível que, em breve, apenas profissionais e apenas amadores muito entusiasmados continuem comprando câmeras.

Enquanto esse dia não chega, ainda existe a preocupação sobre como escolher uma câmera. A nossa forma de tentar, a partir do nosso pensamento cartesiano, é fazer uma lista de opções e comparar números. Megapixels, velocidade, abertura da lente, tamanho da tela, peso, número de botões e tudo o mais. Também incluímos os termos criados pelos departamentos de marketing para falar de especificações que prometem grande resultados.

O problema é que prestar atenção demais no equipamento atrapalha a boa fotografia. Para fotografar bem, é preciso construir uma relação íntima e significativa com aquilo que estamos fotografando. Desenvolver um “ver” que que esteja conectado ao assunto, seja ele qual for. E aí, se a câmera entra no meio, essa relação se perde. A câmera precisa desaparecer.

Foto: Holy [K]
Foto: Holy [K]
Se você concorda com isso, entenderá, então, que os critérios para escolher uma câmera não devem ser números, tampouco o raciocínio de conseguir a melhor câmera pelo dinheiro que você tem. O critério será ter uma câmera que possa sumir enquanto você está fotografando. A partir disso, podemos pensar em três pontos práticos:

Escolha uma câmera que você não terá medo de usar

Se você tiver um equipamento muito caro e sofisticado, provavelmente se preocupará com quedas, quebras, assaltos. Isso pode deixar você tenso na hora de fotografar. Tenha um equipamento com o qual você não precise se preocupar, que não causará muito prejuízo ou falta caso você o perca ou ele se quebre. Assim você poderá fotografar onde quiser e poderá realmente usar sua câmera. Sua fotografia ficará mais livre.

Escolha uma câmera que você possa operar sem ter que pensar

A operação da câmera deve ser automática. Sempre existe um tempo de aprendizado, mas depois disso, se você precisar pensar no que vai fazer, ficar procurando opções em menus e uma miríade de botões, sua fotografia perderá espontaneidade e sua atenção não estará naquilo que importa.

Escolha uma câmera que não deixe você deslumbrado

É natural se animar com a câmera no início, mas se você fica deslumbrado com suas possibilidades, com sua qualidade, sua atenção também não estará no assunto. O equipamento é uma ferramenta, um meio, e não um fim. A menos que o seu propósito seja realmente apenas brincar com o equipamento.

Em suma, não escolha uma câmera da qual você se orgulhe, que chame sua atenção, que faça você querer ficar brincando com ela mesma. Escolha uma câmera que você possa esquecer.

 

Foto do topo: Toffee Maky

Minimalismo fotográfico

Há alguns anos, cheguei a ter sete câmeras fotográficas em casa. A maior parte era de máquinas analógicas: reflex, telemétricas e compactas. Uma delas era médio formato, as outras usavam filme 35mm. As digitais eram duas, sendo uma compacta avançada e uma reflex. Havia também uma boa quantidade de lentes e adaptadores, que me permitiam usar as lentes das câmeras analógicas na reflex digital.

Todo esse equipamento “pedia” uma série de acessórios, que também fui adquirindo ao longo dos anos. Tripé, dois flashes, um scanner para os negativos, mesa de luz, impressora, computador de mesa, HD externo, fotômetro, filmes, filtros, tanque para revelação, químicos. A maior parte desse material, novo e usado, foi comprada de várias fontes —desde lojas de rua até o eBay, passando por lojas em viagens para o exterior — num período de três a quatro anos, em que minha paixão pela fotografia teve seu pico.

A relação com a fotografia não parava nos equipamentos. Tive diversos livros, que comprei ou que ganhei de presente de pessoas que sabiam do meu interesse pelo assunto. Em um determinado momento, entre câmeras, lentes, acessórios e livros, toda a minha “coleção” de materiais fotográficos era relativamente grande.

Eram coisas que eu de fato usava. Nunca comprei nada que não fosse ser útil. Nos momentos de maior atividade, cheguei a fotografar com câmeras utilizando todo o equipamento, como o fotômetro externo, revelar filmes preto e branco em casa, escanear e tratar. Os livros que comprei e ganhei foram lidos, relidos e consultados. Sinto que aproveitei todo esse material.

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Com o tempo, no entanto, minha fotografia foi ficando mais simples. Não tinha o mesmo entusiasmo para carregar muita coisa, para fazer uma fotografia muito complicada, para revelar meus próprios filmes. Precebi que a maior parte das fotografias que eu fazia poderiam ser tiradas com qualquer câmera. Pouco a pouco, fui me desfazendo do equipamento. Doei os livros, o computador de mesa, algumas câmeras. Emprestei outras sem esperar que fossem devolvidas. Os flashes quebraram e não me preocupei em consertá-los ou substitui-los.

Em 2012 comprei minha última câmera: uma compacta avançada, usada, que cabia no bolso. Em diversas viagens e momentos significativos, levei apenas ela. Foi mais do que suficiente. Hoje tenho apenas essa câmera digital e mais uma de filme, com uma lente. Às vezes, quando vejo os equipamentos mais novos, fico um pouco tentado. Ao perceber isso, procuro valorizar aquilo que já tenho. Reconheço, aí, que essas duas câmeras que uso já são suficientes, se não forem excessivas. E, se restar algum impulso de comprar algo novo, é só lembrar do peso que é carregar uma câmera grande, preocupar-me de sair na rua com um equipamento caro, fora tudo aquilo que posso fazer com o dinheiro que seria gasto para comprar e manter um equipamento novo, que o resto de vontade logo desaparece. E fico em paz.

No ano passado, fui a Brasília para uma oficina de fotografia contemplativa no f/508. No dia da saída fotográfica, estava só com o celular. Foi mais do que suficiente para acompanhar a proposta do curso. Não sei se a fotografia que faço se tornou um reflexo do equipamento que levo ou o contrário. Talvez seja algo anterior: uma valorização do simples e do aqui e agora que precede ambos.

Mamiya C330

A Mamiya C330 é uma câmera de médio formato, no estilo TLR (twin lens reflex), na qual a lente superior serve para composição, ao projetar a imagem no despolido que é visto pela parte de cima da câmera e a lente inferior é a que efetivamente faz a foto. As TLRs mais famosas eram as Rolleiflex, que até hoje têm seus usuários fiéis. As TLRs têm duas características diferenciais que as tornam interessantes: primeiro, o fato de serem seguradas na altura do peito ou da barriga — assim como algumas outras médio formato, como as Hasselbads — tornam o auto fotográfico algo menos agressivo; segundo, o formato quadrado, com fotogramas de 6 x 6 cm. Cada rolo de filme 120 rende 12 fotos.

A C330 é uma câmera pesada, com cerca de 1,7kg. Seu atributo principal é, ao contrário da maioria das TLRs, contar com objetivas intercambiáveis. Ela tem correção de paralaxe e o foco se dá estendendo a parte frontal da câmera, revelando um fole nas laterais. Por conta disso, dependendo da distância do foco, é necessário compensar a exposição, o que é indicado por uma agulha no visor superior. Como a câmera não tem fotômetro, ela necessita de um externo — ou uma tabela de exposição. A vantagem disso é que ela não usa nenhuma bateria, sendo a sua operação totalmente mecânica. Uma vez que o seu espelho é fixo, sua operação também é mais silenciosa, quando comparada a uma SLR. A C330 data dos anos 70 do século passado. Ela chegou a ser fabricada no Brasil, na Zona Franca de Manaus.

 

Usar uma TRL torna fotografar uma experiência diferente. As pessoas perguntam: “isso funciona?”. Ficam admiradas de ver que ela gera uma imagem com alta definição, especialmente usando cromo, por conta da área do negativo, que é 4 vezes maior do que um fotograma de 35mm. A C330 é muito pesada para uma caminhada longa com ela no pescoço, mas em situações mais estáticas seu uso vale a pena. A profundidade de campo curta permite desfoques interessantes, mas por outro lado requer cuidado na focagem, uma vez que um elemento aparentemente em foto pode na verdade estar ligeiramente desfocado. Há uma lente no capuchão que permite ampliar a — já grande — imagem projetada no despolido.

Mais informações (em inglês):
http://en.wikipedia.org/wiki/Mamiya_C330
http://bipmistry.wordpress.com/mamiya-c330/
http://www.lumieresenboite.com/collection2.php?l=2&c=Mamiya_C330

Manual online (em inglês):
http://www.propellerheads.com/technical/c330s/

Câmeras e fogões

Na última sexta, eu e minha amiga Paula Porto andávamos pelo centro de São Paulo, na região da Rua Sete de Abril, famosa por reunir diversas lojas de material fotográfico. Estávamos indo até o laboratório do sr. Ogava, na Rua Barão de Itapetininga, para deixar alguns rolos de Tri-X para revelar. Paula tem um blog de culinária bastante conceituado, o …de Salto Alto na Cozinha. As fotos dos pratos que ela apresenta no site são feitas pelo seu marido, Ricardo. Passando pelas lojas cheias de câmeras e lentes nas vitrines, começamos a conversar sobre equipamentos, fotográficos e culinários.

Ela me contou que tinha alguns amigos que também gostavam de fotografia. Ela explicou que o padrão que eles apresentavam era de aquisição de uma grande quantidade de material: lentes, mochilas, acessórios. Fazendo uma analogia com a culinária, ela falou, em tom divertido, sobre pessoas que tinham fogões e equipamentos de cozinha caros e sofisticados, mas que apenas os utilizavam para receitas extremamente simples, para as quais não havia necessidade de tanto. Constatamos que existe, muitas vezes, um fetiche pela manipulação da ferramenta como mais importante do que a criação de fato. Ou seja, há pessoas que gostam de usar a câmera, mais do que de fazer fotos; ou de usar o fogão, mais do que de cozinhar.

Sergey Podatelev
Sergey Podatelev

Enquanto esperávamos o elevador no antigo prédio a poucos metros do Teatro Municipal, perguntei se as pessoas sobre quem ela falou eram felizes fazendo isso. Ela disse que sim, que eles se divertiam muito tanto com suas câmeras como na cozinha. Respondi, então, que achava que não havia mal nenhum nisso e que, na verdade, era isso que importava. No fundo, o que todos queremos é fazer aquilo que nos faz bem, e me parece fora de lugar criticar alguém porque seu prazer está na operação dos equipamentos e não na criação de fotografias — ou pratos.

Chegamos ao laboratório. A sala em que o Ogava nos recebe estava no seu habitual caos, repleta de pacotes amarelos de filmes revelados, fotografias ampliadas, algumas câmeras antigas jogadas em um canto e a antiga TV de tubo sobre um móvel. A janela estreita e longa no fundo da sala, condizente com o alto pé direito, permitia a entrada da luz opaca, típica de um dia chuvoso de outubro. Deixei dois rolos de filme para revelação e pedi que ele ampliasse, em 30×40 cm, o retrato de um casal de amigos que se juntará em breve e que eu havia feito alguns meses antes: será uma espécie de presente de casamento. Conversei com ele sobre como fazer o corte para acertar o quadro na proporção do papel e fomos embora.

We Make Noise !
We Make Noise !

Embora eu já tenha sido muito crítico em relação a questão da supervalorização do equipamento — e provavelmente alguns dos textos mais antigos do Câmara Obscura refletem isso — hoje não me sinto à vontade para criticar a forma como as pessoas escolhem usar o seu tempo. Há uma espécie de paradigma, entre fotógrafos amadores-avançados e profissionais, que diz que as pessoas não podem simplesmente usar uma câmera e fotografar os momentos relevantes da sua vida. De acordo com essa concepção, elas têm que estudar fotografia, têm que saber como usar a câmera, têm que fazer cursos, têm que ler livros, têm que saber compor, e por aí vai. Mas, pensando a fundo, não consigo imaginar nenhuma boa razão para todas essas obrigações. A impressão que dá é que todo mundo é obrigado a produzir obras-primas o tempo todo. Essa concepção não é apenas ditatorial — é também impossível.

Não deixo de pensar, no entanto, que para aqueles que de fato querem fazer fotos significativas — por opção, não imposição — que além de todo o estudo que realmente é necessário, é preciso utilizar o equipamento com racionalidade. Uma boa câmera compacta, ou uma reflex digital com a lente do kit (em geral 18-55mm), ou uma reflex analógica com uma lente de 50mm são mais do que suficientes para um fotógrafo inspirado, com boas ideias e disposição para procurar as melhores imagens. Até porque a “limitação” do equipamento ajuda no desenvolvimento de outras habilidades que são essenciais para a boa fotografia e não estão na operação da câmera (escolha do assunto, leitura da luz, ângulo, momento). Isto posto, posso até arriscar uma conclusão: se o seu prazer está na operação da câmera — e não há nada de errado nisso — você provavelmente está certo em ter o máximo de equipamento possível. No entanto, se a sua busca é por uma fotografia significativa no seu conteúdo, talvez seja uma boa ideia reduzir o equipamento ao mínimo possível.

O perturbador Kodachrome

Kodachrome é o nome de uma série de filmes fotográficos positivos (slides) fabricados pela Kodak entre 1935 e 2009. Durante o tempo em que foi produzido, era um dos filmes coloridos mais utilizados, tendo sido fabricado em diversos formatos, tanto para fotografia quanto para filmagem.

Na primeira vez em que vi um slide Kodachrome de 35mm nas minhas mãos, me assustei. O susto foi pelo fato da foto ter sido feita há mais de 30 anos e as cores, o contraste e a estrutura do filme estarem impecáveis. Mesmo não tendo sido armazenados com muito cuidado, os slides pareciam ter sido fotografados no dia anterior. Outros filmes que estavam armazenados juntos estavam praticamente destruídos pelo tempo e pelos fungos. Esses outros filmes, ou mesmo as fotos impressas, vão se desgastando com o tempo, perdendo suas cores e contrastes. Assim, quando vemos uma foto antiga, há uma espécie de embaçamento que nos distancia da imagem e denuncia a época em que foi feita. Quando guardados da forma correta, os Kodachromes aguentam por 50 anos ou mais, preservando suas características. E aí, quando nos deparamos com uma dessas fotos, sem o embaçamento esperado, há um choque pelo não distanciamento, que abala nossa concepção de tempo.

Se você fizer uma busca pelo termo Kodachrome, verá uma série de fotografias feitas com ele há 2, 10, 20, 30 ou até 70 anos. O perturbador nisso tudo é que não há diferença entre as fotos. Todas parecem atuais. Vemos uma reunião de família ou dois irmãos num gramado com cores tão vívidas que é difícil acreditar que aqueles momentos já ficaram tão longe no passado. As fotos abaixo foram feitas com Kodachrome nas décadas de 1950 e 1960.

Só depois de algum tempo pensando na questão do Kodachrome, percebi que a mesma coisa acontecerá daqui a algum tempo com as fotografias digitais. Depois da sua evolução inicial, o aspecto visual das fotos digitais passou a um patamar homogêneo. Se não houver uma grande mudança nesse aspecto geral, e se daqui a algumas décadas as fotos ainda se parecerem com as de hoje – em termos de cores e contraste, mesmo que visualizadas na tela – não teremos mais o embaçamento que nos permite situar a época em que a foto foi feita. Teremos que nos situar através de outros indicadores, como as roupas, cortes de cabelo, design de móveis ou carros. É complicado falar sobre o que pode ou não acontecer numa época em que tudo muda tão rapidamente como nos dias de hoje. Mas, se a fotografia digital continuar essencialmente a mesma, talvez ela faça com que alteremos, ainda que ligeiramente, nossa relação com o tempo, da mesma forma que fez o Kodachrome.

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No post de hoje, abro uma exceção e, em vez de publicar um texto próprio, posto a tradução, feita por mim, de um post do blog mnmlist.com, de Leo Babauta. O artigo fala de consumo e da forma como lidamos com as marcas na nossa sociedade. Esse é um tema muito apropriado para alguns grupos de fotógrafos e suas comunidades, que tendem a valorizar mais o equipamento do que a criatividade. Que adoram entrar numa loja de câmeras, mas raramente vão a uma exposição de arte. Que adoram ostentar as marcas que defendem, mas cuja fotografia diz muito pouco.

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O minimalismo é uma contrapartida à tendência de transformar pessoas em puros consumidores, em commodities, em um mecanismo de mercado.

Perdemos a noção da simples verdade de que não precisamos de nenhum desses produtos que os marqueteiros e publicitários nos empurram. Continue lendo “Anúncios ambulantes”

A outra história da evolução das câmeras

A fotografia revolucionou a sociedade desde o momento em que foi inventada. Ao possibilitar o registro estático de cenas reais, permitiu a todos reter memórias de lugares, pessoas e eventos. A invenção da câmera tornou viável a realização dessa tarefa quase mágica que, antes disso, ficava apenas no imaginário. Vejamos como esse instrumento evoluiu, desde sua invenção até hoje, com destaque para os avanços tecnológicos envolvidos. Continue lendo “A outra história da evolução das câmeras”

E o Tri-X sobrevive

No início da década, quando a fotografia digital começou a aparecer no mercado, ela pouco competia com o filme, pois sua qualidade ainda era pífia quando comparada àquela obtida pela fotografia analógica. No entanto, ao longo dos anos, a evolução das câmeras digitais tornou o filme algo extremamente obsoleto, já que não só a qualidade se equiparou, como os preços de câmeras digitais caíram vertiginosamente. Por conta disso, muitos filmes deixaram de ser fabricados simplesmente porque não vendiam mais, já que quem os consumia em maiores quantidades – os profissionais – migraram para os sistemas digitais.

No entanto, um filme de 56 anos, preto e branco, ainda é um campeão de vendas, em pleno 2010: o Kodak Tri-X 400. Introduzido em 1940 em grande formato e ISO 200, em 1954 passou a ser comercializada a versão atual: ISO 400, em rolos de 35mm ou 120 (médio formato). O Tri-X é um filme com granulação clássica, rápido (para os padrões da fotografia analógica) e o preferido de muitos fotógrafos conceituados, em especial os documentaristas.

Em São Paulo, o Tri-X ainda é relativamente fácil de encontrar e os preços estão relativamente estabilizados. Na Chromur, eles vendem rolos rebobinados a R$ 17 cada e “originais”, na caixinha, por R$ 26 (preços de 22/10/10), enquanto na Capovilla o rebobinado sai a R$ 25. Um pouco salgado, considerando que nos Estados Unidos um rolo 35mm original sai por US$ 4. Se você tiver uma conta no PayPal e paciência, é fácil encontrar o filme no eBay por esse preço, inclusive em pacotes com 10 rolos a US$ 40.

Parênteses para quem não está familiarizado com o filme rebobinado: os filmes fotográficos, como o Tri-X, também são vendidos em rolos de 100 pés, contidos em uma lata. Nesse caso, é necessário rebobinar o filme para dentro dos cassetes e cortá-los, para utilização nas câmeras. Algumas lojas compram o filme em lata para rebobinar e vender cada cassete a um preço mais baixo que o rolo de 35mm original. Falo em “original” referindo-me ao que vem num cassete próprio, dentro da caixinha da Kodak, mas nos dois casos o filme é o mesmo. Geralmente não há problemas com o rebobinado e você ainda ganha umas exposições extras, já que ao rebobinar eles costumam deixar alguma folga. Já comprei filmes rebobinados que renderam 40 poses.

Diz-se que o Tri-X tolera bem ser puxado para ISO 800, sem necessidade de compensação na revelação, e para ISO 1600, com necessidade de ajuste no tempo de revelação. Caso você queira se aventurar a revelar o Tri-X, o tempo indicado para o revelador D-76 é de 6 minutos e 45 segundos a 20º (9 minutos de 45 segundos para D-76 com diluição 1:1 a 20º). Mais detalhes podem ser encontrados nessa tabela de tempos de revelação de filmes preto e branco da Kodak.

De tempos em tempos, quando quero obter nas fotos o aspecto PB característico do filme, ou quando acho que algum assunto é interessante o suficiente para mantê-lo num suporte físico, uso direto o Tri-X, como fiz numa série recente, Aikido. Abaixo, há uma galeria com fotografias feitas com o Tri-X e disponibilizadas no Flickr sob licença Creative Commons.

Fontes:
Kodak
Wikipedia
The Online Photographer

Câmeras viraram “gadgets”

Há dez anos, quando a fotografia digital começou a se tornar uma realidade para o mercado, as câmeras — e consequentemente as fotos produzidas por elas — ainda eram muito inferiores às de filme, no que se refere à qualidade. Lembro de usar, nessa época, durante a minha graduação, uma Sony Mavica que gravava imagens de 640×480 pixels em um disquete. Ainda tenho algumas fotos daquela época e vejo que são do nível de fotos de celulares de três ou quatro anos atrás.

Pois bem, a partir desse momento, a fotografia digital evoluiu rapidamente. Em cinco anos, já havia atingido um padrão de qualidade que permitia substituir o filme na maior parte das aplicações. Os fabricantes, durante esse período, concentraram-se principalmente em aumentar a resolução, que era a maior deficiência das câmeras digitais, mas também trabalharam no sentido de fornecer arquivos com mais latitude, menos ruído e diversos formatos.

Chegou-se, então, a um ponto em que as câmeras digitais chegaram num patamar que, para a grande maioria dos usuários, era satisfatório. Com uma câmera de 8 megapixels é possível fazer boas ampliações em quase todos os formatos mais utilizados, há um bom nível de captura de detalhes, cores e luzes, com toda a praticidade do digital. A partir daí, para o consumidor comum, não se justificaria mais o desenvolvimento em termos de aumento de resolução e melhora da qualidade de imagem (embora isso sempre seja justificável para aplicações profissionais ou para maníacos por equipamentos).

O que vemos, no momento, é justamente uma guinada no desenvolvimento dos equipamentos de uso amador. Não se fala mais em câmeras com mais resolução, mais qualidade ou melhor para fotos com pouca luz. Temos, em vez disso: câmeras que fotografam sozinhas (como a Sony Party Shot), que fazem panorâmicas automaticamente, que possuem visor frontal para que se possa tirar “autofotos” melhores, que filmam em alta definição, GPS, wi-fi, entre muitos outros “diferenciais” do mercado. Torna-se claro, então, que os fabricantes estão buscando agregar valor a seus produtos oferecendo recursos supérfluos, que pouco têm a ver com a fotografia em si.

O que se pode concluir ao observar esse movimento é que até pelas atitudes dos fabricantes, fica claro que você não precisa de uma nova câmera, a menos que você esteja pretendendo mudar de categoria (por exemplo, trocar uma compacta por uma reflex). Se não for o caso, a sua câmera digital, mesmo que tenha lá seus três ou quatro anos, já faz muito bem aquilo a que se propõe: tirar fotos. Câmeras mais novas oferecerão muito pouca diferença na qualidade das imagens, embora venham com uma série de recursos adicionais embutidos. Ou seja, elas valem a pena apenas se você é um louco por gadgets, mas não se justificam para alguém que queira apenas fotografar e aperfeiçoar a sua fotografia.